sexta-feira, 15 de junho de 2012

M,

Ele era tão lindo que tive vontade de roubar uma foto. Não daqueles roubos em que se espreita um descuido para esconder o objeto roubado num bolso qualquer com movimentos sorrateiros. Não. O roubo era em parte um pertence meu, porque tudo só faria sentido se a foto fosse tirada por mim. Sempre fui cabeça dura, eu sei. Te conheço tão bem que já sei o que você vai falar. E não me venha com ciúmes, que sou intolerante a exigências de quem não quis me tomar por completo. Pague o preço pela sua ausência e leia aí quietinho, sem reclamar.

O que eu sei é que era lindo. Nunca falei com ele, parte de mim quer trazer de volta o frio na barriga dos amores platônicos. Não quero saber nome e nunca dei o menor sinal de que ia me aproximar. Só observava, de longe, sempre desejando ter uma câmera à mão. Apesar da distância velada e da minha postura sempre impassível, percebi que ele também me olhava. E me seguia.

Não que essa fosse uma relação entre psicopatas que se procuravam sem se tocar, cuidado com os pensamentos errados. Nos seguíamos como quem segue um pássaro voando, só com o olhar. E todos os poucos encontros duraram milésimos de segundo.

Mas houve encontros. Nunca ouvi a voz dele nem ele ouviu a minha, mas sempre que ele se aproximava e eu fingia ler um livro qualquer, percebia que ele estivera olhando e disfarçava rapidamente. Nos entendemos assim: com breves encontros e olhares furtivos.

Cheguei até a sentar do lado dele uma vez. Éramos dois bonecos de madeira desconcertados, atrapalhados com os próprios movimentos. Saí rápido, com a pressa de quem descobre a própria maturidade (conquistada a duras penas!) substituída pela taquicardia de uma adolescente de 13 anos. No dia seguinte, aconteceu de nos encontrarmos de novo. Dessa vez, por sorte minha, ao invés de um livro eu tinha uma câmera. O clique veio sem planejamento. O resultado veio fora de foco, tremido e pálido. Como as lembranças. Guardei a foto na minha caixinha de recortes temporais não-descritíveis.


Sua (será?), S.

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